Sociedade do cansaço

Sociedade do cansaço, livro escrito por Byung-Chul Han. Este é um livro curto com cerca de cento e trinta páginas e traz uma reflexão interessante sobre a sociedade atual. Aqui vou deixar um pouco da minha interpretação do livro e como vejo isso acontecendo, principalmente na área de tecnologia.

A princípio, o tema central do livro é que vivemos em uma sociedade cansada e que as doenças como depressão, ansiedade, burnout, déficit de atenção e hiperatividade são os efeitos desse cansaço. Basicamente, vivemos em uma sociedade onde tudo é possível, onde temos direito a tudo, e com esse excesso de possibilidades sentimos a culpa de não darmos o melhor. Este efeito se torna ainda maior quando paramos de usar como referência apenas as pessoas no nosso círculo mais próximo e expandimos isso ao nível do mundo. Com o advento do trabalho remoto nos dias atuais, você pode estar trabalhando com alguém que passou pelas melhores empresas e instituições de ensino pelo mundo e sempre ter o sentimento de estar atrás em algum aspecto, dessa forma, se força a correr atrás da diferença. Não que isso seja ruim, querer melhorar é algo positivo, mas pode ser um problema quando isso toma conta da sua vida, principalmente ao se sobrecarregar e não conseguir mais parar até eliminar a diferença. Porém, a diferença pode nunca ser eliminada, visto que ao mesmo tempo que você melhora, as outras pessoas também melhoram e assim acabamos presos em um ciclo sem fim. A solução é então sempre nos compararmos a nós mesmos, tornando essa comparação justa e tangível.

O livro também traz uma reflexão sobre sermos melhores que nós mesmos, dando a entender que esse seria o ponto máximo dos sujeitos da sociedade do desempenho, que termina sendo uma sociedade cansada. Os sujeitos do desempenho, estão sempre buscando ser melhores que eles próprios visto que é algo tangível, uma vez alcançado eles poderiam parar. Entretanto, isso não é verdade já que eles nunca conseguem chegar a conclusão, sempre há algo para ser melhorado e assim coagem a si mesmos. Estas pessoas acabam se forçando a produzir mais e nunca conseguem chegar em um ponto de repouso ou de gratificação, estão sempre com o sentimento de culpa e carência de alguma coisa. Aqui é importante ressaltar as infinitas possibilidades que também temos com o advento da tecnologia. Temos acesso a tanta informação, cursos, livros e, se querermos saber de tudo, entraremos nesse ciclo que nunca termina e nunca sentiremos a gratificação de terminar algo. O ponto não é simplesmente abolir o melhoramento pessoal, mas ter ideia de onde parar, celebrar as conquistas e, principalmente, não deixar que este processo tome conta da sua vida.

O outro ponto conectado com as duas reflexões anteriores é que na sociedade do desempenho, onde tudo é possível e somos donos de nós mesmos e buscamos sempre melhorar, empreender, ter iniciativa, nos vemos como pessoas livres. Podemos fazer aquilo que bem desejarmos. Enquanto isso de fato é uma realidade frente a uma sociedade proibitiva, nesse cenário passamos a explorar a nós mesmos. Quando estamos sempre querendo ir além, passamos a carregar conosco o campo de trabalho e nos forçamos a sempre ser melhor. Enquanto no passado esse tipo de exploração, alguém lhe forçando a algo, ficava clara na separação entre o explorador e o explorado, na sociedade do desempenho essa separação não existe mais. As pessoas se auto-exploram e, com isso, atingimos o ápice da exploração. Quando havia um outro explorando algo, é possível ver a diferença e combatê-la, porém quando nós nos exploramos, além de ser mais difícil de identificar esse processo, também é mais difícil de combatê-lo, visto que temos que dizer não a nós mesmos em uma sociedade onde tudo é possível.

Por fim, como sempre buscamos melhorar a nós mesmos nesta sociedade do desempenho, acabamos recorrendo a estimulantes externos para nos manter ativos. No caso, o livro menciona que se dopping fosse aceito nos esportes, as competições passariam a ser uma competição farmacêutica e não mais dos esportistas. Este exemplo é interessante porque, enquanto isso seria aceitável em algumas áreas, parece ser algo problemático em outras. Por que uma pessoa não pode tomar algo para se manter mais atenta durante o dia? Se as pessoas acabam sendo comparadas por alguma medida, talvez isso tenha o mesmo efeito do doping nos esportes, gerando uma comparação indevida.

As ideias acima são a minha interpretação e resumo de algumas das principais ideias do livro. Tem muito mais e com certeza verei muito mais ao relê-lo no futuro. Por fim, fica a minha visão sobre a área de tecnologia neste contexto.

Com certeza, as pessoas dentro da área da tecnologia acabam sendo parte de uma sociedade de desempenho. Sempre há a necessidade de melhorar, aprender algo novo, estar por dentro das novidades. Enquanto isso é algo bom e nos mantém ativos, também vejo como uma forma de gerar ansiedade e estresse pela profissão, que se torna a maior parte da vida, ao invés de ser parte dela. Uma das principais ideias dentro da área é que apenas fazer o seu trabalho nunca será suficiente, você tem que se dedicar no tempo livre para melhorar. Novamente, não vejo isso como um grande problema, se você tem que participar de uma conferência aqui e ali por ano, participar de um grupo de usuários ou algo assim. Talvez o problema esteja em normalizar que é necessário investir um número de horas diárias para melhorar, afetando completamente a vida das pessoas. O outro ponto que realmente torna isso interessante é que é normal ver as pessoas com uma dependência a tomar energéticos, ou quantidades absurdas de café a fim de manter um alto nível de produtividade. Se as pessoas estão cansadas, elas devem descansar e não tomar medidas paliativas momentâneas mascarando o real problema. Este ponto é, talvez, um dos mais curiosos da área, principalmente quando as empresas comparam as pessoas. Se comparamos alguém que tem um alto desempenho usando algum tipo de medicamento com alguém que tem um desempenho normal, mas que não faz uso desses medicamentos, qual é o real valor dessa comparação? Talvez essa seja uma das grandes questões que passam por muitas pessoas e que acabam seguindo as tendências da área para não ficar para trás.